quarta-feira, 30 de setembro de 2015

COEFICIENTE ELEITORAL: COMO SÃO ELEITOS OS DEPUTADOS E VEREADORES NO BRASIL

Mais uma eleição se aproxima! No próximo ano, os municípios de todo o Brasil serão invadidos por propagandas de milhares de candidatos a vereador e prefeito, fomentando a incessante luta pelo voto de mais de cento e quarenta milhões de brasileiros, em mais um capítulo da chamada “festa da democracia”.

Ante a proximidade de mais um processo eleitoral, alguns esclarecimentos acerca dos sistemas eleitorais adotados no Brasil, em especial no que se refere ao sistema proporcional, utilizado nas eleições para deputados e vereadores, fazem-se necessários, de forma a melhor instruir o eleitor sobre a função e a importância do seu voto.

Por sistema eleitoral, podemos compreender as técnicas que determinam a forma de escolha dos representantes do povo nas eleições. Dois são os sistemas eleitorais verificados no Brasil: o sistema majoritário, aplicado às eleições para os cargos de presidente da república, governador de estado ou do Distrito Federal, prefeitos e senadores; e o sistema proporcional, utilizado nas eleições para os cargos de deputado federal, deputado estadual, deputado distrital e vereador.

Em relação ao sistema majoritário, poucas dúvidas persistem na mente dos eleitores: ganha a eleição o candidato mais votado, sendo que nas eleições para presidente da república, governador e prefeito de município com mais de duzentos mil eleitores é possível a ocorrência de segundo turno, entre os dois candidatos mais votados, caso nenhum candidato alcance, no primeiro turno, votação superior aos votos dados a todos os seus adversários somados, excetuados aqueles brancos, nulos e as abstenções. As maiores perplexidades, assim, ecoam das chamadas “eleições proporcionais”, para os cargos de deputados e vereadores, onde nem sempre o candidato mais votado é eleito e, em algumas ocasiões, um candidato pouco votado conquista um assento em disputa na casa parlamentar. Por que tal fato ocorre? Por que candidatos menos votados conseguem, em uma mesma eleição, conquistar uma vaga de deputado ou vereador enquanto outros, com votações mais expressivas, não conseguem se eleger?

Nas eleições para os cargos de vereador e deputado, em nosso país, ao contrário das eleições para os cargos de presidente, governador, prefeito e senador, adota-se o sistema eleitoral proporcional, que, em sua essência, privilegia uma distribuição mais ampla das vagas em disputa, consagrando, de forma mais eficiente, o princípio democrático, consistente não apenas no respeito à vontade da maioria, mas também na consagração da representação das minorias, fundamental à fomentação do salutar processo dialético de construção da vontade geral. Assim, em linhas gerais, cada partido ou coligação partidária conquistará, proporcionalmente à soma dos votos obtidos pela legenda e por todos os seus candidatos somados, um determinado número de cadeiras em disputa, privilegiando a ampliação da representação das mais diversas correntes políticas e ideológicas existentes na sociedade.

Para melhor compreendermos o funcionamento do sistema eleitoral proporcional, imaginemos que em um determinado município existam 1.200.000 eleitores. No dia da eleição, do total de eleitores comparecem às urnas 1.000.000 de pessoas, sendo que destas duzentas mil votam branco ou anulam o voto, totalizando-se, assim, 800.000 votos válidos (imputados a algum candidato ou coligação). Imaginemos ainda que, neste município, estejam em disputa 40 vagas para a câmara de vereadores, concorrendo para as mesmas candidatos de vários partidos políticos. Qual será o primeiro passo para determinar os eleitos? A resposta para este questionamento é o cálculo do chamado “coeficiente eleitoral”, vislumbrado a partir da divisão do número de votos válidos (800.000, no presente exemplo) pelo número de vagas em disputa (40 vagas). Assim, o coeficiente eleitoral será de 20.000 votos.

Calculado o coeficiente eleitoral, o segundo passo para a definição dos eleitos é o cálculo do chamado quociente partidário. Para isso, é necessário que o número de votos sufragados para cada partido ou coligação (somados os votos de todos os seus candidatos e os votos de legenda) sejam divididos pelo coeficiente eleitoral, estabelecendo o número de vagas em disputa a que cada partido fará jus. No exemplo citado, um partido ou coligação que obtivesse a soma de 100.000 votos teria garantido o direito a cinco das vagas em disputa (quociente partidário igual a cinco).

Como quase nunca a divisão do número de votos válidos sufragados a um determinado partido ou coligação pelo coeficiente eleitoral resulta em um número inteiro, é natural que nem todas as vagas em disputa sejam preenchidas a partir do simples cálculo dos quocientes partidários, resultando sobras de vagas. Como tais sobras não podem existir, devendo todas as vagas serem preenchidas, um terceiro passo é procedido, a partir da divisão do coeficiente eleitoral pelo quociente partidário obtido por cada partido ou coligação mais um, concedendo-se a vaga remanescente ao partido ou coligação que obtiver a maior média. O mesmo procedimento se repete, tantas vezes forem necessárias, até que todas as vagas remanescentes sejam preenchidas, devendo-se observar, evidentemente, que, a cada nova vaga conquistada, ao quociente partidário de cada partido será somado um.

Ao longo da história brasileira, algumas distorções já ocorreram em virtude do desconhecimento popular acerca do sistema eleitoral proporcional e da tradição fomentada nos eleitores de votar em pessoas, e não em partidos. Assim, por exemplo, famoso se tornou o episódio Enéas, ocorrido em São Paulo em 2002, quando o falecido deputado, a partir da sua estupenda votação, elegeu mais cinco correligionários, todos inexpressivos. Da mesma forma, notável foi a grande votação obtida em 1998 pelo ex-líder estudantil Lindberg Farias, candidato a deputado federal, no estado de São Paulo, pelo PSTU, que, no entanto, não conseguiu se eleger, em virtude do não alcance, por seu partido, do quociente partidário mínimo de um.

Mesmo diante de tantas críticas, produto muito mais da falta de conhecimento do eleitorado do que de falhas intrínsecas, o sistema eleitoral proporcional pode ser considerado um instrumento de grande relevância para a consagração do regime político da democracia, devendo, no entanto, ser mais divulgado e explicitado ao nosso povo. Afinal, a essência da democracia reside na dialética e na existência de oposições, e não na imposição cega da vontade da maioria.

Fonte: Jaime Barreiros Neto - Publicado no livro “Temas de Ciência Política”/http://novoeleitoral.com/ / Via RN POLITICA EM DIA

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